A cartomante

Ainda que sempre tivesse tido muita curiosidade, Milena nunca havia se encorajado a visitar uma cartomante. A melhor amiga foi quem indicara Dona Madalena “uma senhorinha simpática, que não ficou me prometendo mundo e fundos, mas que me falou muitas coisas que tinham sentido”, assim definida. O preço era justo e seu atendimento era num local público, pertinho de sua casa.

Marcou horário para uma tarde de sábado e logo simpatizou com a velhinha, que lhe explicou como funcionava seu trabalho e as cartas de tarot. Milena tiraria as cartas três vezes, podendo fazer perguntas sobre três áreas distintas de sua vida; além de ter de “bônus” a chance de ter uma visão geral de seu futuro.

Perguntou sobre seu trabalho e a saúde de seu pai que estava um pouco abalada devido aos anos de cigarro e bebidas. As respostas foram muito positivas e, sem que a consultante falasse muito sobre sua situação, Dona Madalena mostrara conhecimento do que se passava com a moça e a tranquilizava mostrando boas surpresas em seu caminho.

Quanto ao amor Milena temia as respostas. Sentia-se frágil e desamparara desde o fim do último relacionamento. Fora doloroso separar-se de Samuel, ainda que soubesse que não tinham mais nada a ver um com o outro. “Estava só e não sentia confiança de que encontraria um grande amor”, foi o que Dona Madalena disse e era o que Milena sentia.

A cartomante dizia que Milena era uma pessoa exigente e difícil de lidar, mas que conheceria alguém que mudaria seus conceitos. Seria o oposto de tudo o que ela imaginava para si, mas Milena se encantaria e aprenderia a ceder, a abrir novamente seu coração. Madalena chegara até a afirmar: “vejo até casamento!”.

Isso fora há cerca de seis meses. Nem se lembrava direito da história, mas, naquela noite, perdida em seus pensamentos sobre os últimos acontecimentos, Milena lembrava-se de cada palavra proferida pela senhorinha de olhos bondosos.

Foi em um evento de trabalho que Milena conhecera Douglas. A primeira impressão não foi muito boa. Ele parecia bravo e bastante reservado. Dias após conversaram e logo viraram amigos. Milena ria muito na companhia de Douglas e, apesar de ele não fazer nem um pouco seu estilo, ela se sentia estranhamente envolvida por ele.

Ao contrário dos meninos que ela saia, ele era mais velho e o cabelo era até levemente grisalho. Era meio natureba, tinha amor pelos animais... Ela não se ligava muito nisso, mas acha graça do engajamento dele. Ele ouvia reggae e ela gostava mesmo era de um bom rock! Mas que papo, que olhar penetrante, que sorriso...

Não demorou muito marcaram o primeiro encontro. Um happy hour, um brinde e um beijo. Douglas se desculpou e foi embora cedo, precisava finalizar um trabalho em casa. Na semana seguinte encontraram-se de novo e na outra de novo. Falavam-se sempre por e-mail. Ela nunca havia reparado, mas ele nunca a havia telefonado. Nem mesmo mandado um SMS... A cada dia Milena fica mais encantada por ele... Tão misterioso...

Já se viam à cerca de um mês quando, após um evento que durou até tarde da noite, Douglas se ofereceu para levar a moça até a sua casa. Parecia um pouco tenso, remexia-se muito. No meio do caminho, propositalmente, mudaram a rota e entraram em um motel. Que noite!

Estavam deitados lado a lado na cama redonda, falando uma besteira qualquer quando o celular dele ligou. Milena viu Douglas ficar branco, falar baixo e nervosamente ao aparelho. Ouviu poucas palavras: “O evento acabou agora pouco”... “Vou deixar o Renatinho em casa” “Te amo, beijo...”.

Nem bem desligou o telefone, Douglas já começou a se vestir. Apressado, vira a camisa do avesso e do avesso e, de dentro de um bolso, Milena percebe cair uma aliança. Grossa, dourada, brilhante. Gentilmente ela a pega do chão e devolve a Douglas, que, gaguejando, tenta se explicar. Milena não quer conversa. Ao ser deixada em casa despede-se com um beijo frio no rosto, como deveria sempre ter sido.

Na cabeça um turbilhão de pensamentos... Mas no final, Dona Madalena até que estava certa: havia sim um casamento, mas quem foi que disse que seria Milena a noiva?